É notório o reboliço que o tema da redação do Enem 2015 está causando. Alguns simplesmente não conseguiram compreender a grande importância do tema da violência contra a mulher na sociedade brasileira ser abordado no exame. Pois bem, eis-me aqui, dando a cara à tapa e expondo os meus pensamentos.
Inicialmente, é constante vermos/ouvirmos relatos de mulheres que sofreram ou sofrem algum tipo de violência. Se não bastasse todo o sofrimento vivido pelas vítimas, a sociedade insiste em culpá-las por todas as mazelas – a meu ver, oriundas do machismo – que recaem sobre as mesmas. Todos os dias mulheres são humilhadas, assediadas, agredidas, violentadas ou mortas.
Todos os dias, mulheres têm os seus direitos e garantias violados, até por aqueles que deveriam zelá-los. Há pouco tempo, alguns projetos de lei totalmente bizarros apareceram atentando contra o direito da mulher – o que se apresenta como um grande retrocesso.
E foi no meio de tanta desgraça que a redação Enem apareceu, como um ponto de luz e esperança. Alguns dizem que foi apenas mais um tema de redação, como outro qualquer. Mas eu discordo. É de uma importância estrondosa que o tema da violência contra a mulher esteja sendo abordado em nível nacional. São milhões de jovens refletindo, concatenando ideias e escrevendo sobre a temática. Isso, simbolicamente, apresenta-se como um avanço social, bem como na educação. Primeiro, porque demonstra a intenção de incorporar os debates das minorias no âmbito nacional. Segundo, porque traz um retrato de como a sociedade brasileira precisa se livrar do machismo e cultivar a igualdade entre os gêneros. Terceiro, porque demonstra a importância de temas sociais, reais e altamente relevantes como este venham a ser estudados e debatidos nas escolas – para que as nossas crianças estejam livres do preconceito.
É sabido que muita gente que fez a prova e está criticando sentiu dificuldade pelo simples fato de não se importar tanto com a causa, por não ler e se manter informado o suficiente para ir à prova. Ou pior... Por possuir como pensamento dominante a ideia de superioridade de um gênero sobre o outro, o que justificaria uma gama de absurdos que acontecem todos os dias.
O fato é que não haverá chance alguma de um pensamento que justifique o machismo ou a violência contra a mulher venha a ser aceito na correção. E isso irá desclassificar muita gente, pois tenho certeza que haverá muita opinião machista e velada, sob a forma de: “Não sou machista, mas...” ou “Na realidade não é bem assim...” ou “Mas talvez a mulher tenha motivado essa violência...”
O mundo tem de evoluir. O Brasil tem de evoluir. E se o indivíduo não consegue por si mesmo evoluir, desprender-se da sua carga preconceituosa, que ele o faça perdendo a chance de uma vaga numa universidade, pois se ferrou na redação. Que o faça quando infringir a lei e for severamente punido por isto. Por último, que o faça quando as pessoas ao seu redor não suportarem conviver com alguém intolerante.
Toda repercussão vai além de uma simples redação. Isso é sobre a moça que foi estuprada pelo namorado e as autoridades não deram a mínima. Isso é sobre a mãe de família que é agredida pelo companheiro. Isso é pela menina que foi apalpada e ficou calada por medo e por vergonha. Isso é pela Maria, que se separou de José e foi morta por ele. Isso é por mim, por você e por todas nós que já sofreram ou sofrem algum tipo de violência, seja ela real ou simbólica.
Que essa redação seja o pontapé inicial para que as questões de gênero, de sexualidade, de igualdade racial, homofobia etc. passem a ser debatidas e estudadas nas escolas. Porque eu quero ver crianças se tratando com igualdade, adolescentes falando de empoderamento, sororidade e empatia. Quero ver a garota negra ser aceita com o seu black power e o garoto gay não ser chamado de “viadinho”. Pois a educação é o mecanismo transformador da sociedade.
Por fim, isso não foi apenas sobre as mulheres. No fundo, a luta representa e empodera todas as minorias prejudicadas, e até então esquecidas.
P.S.: Não quero que o mundo seja feminista, mas desejo com o coração que todos se aceitem, e principalmente se respeitem.